Os valores patriarcais que enfatizam a aquisição do poder, o pensamento racional e estar no controle são inconscientes ou conscientemente adotados e praticados por mães e pais, colegas, escolas e instituições que gratificam ou punem comportamentos dos meninos. Resulta disso que os homens aprendem a se conformar abafando suaindividualidade e com ela suas emoções. Aprendem a assumir a persona correta ou, a atitude aceitável – encobrindo os medos que têm para com o mundo – junto com o uniforme esperado de sua classe social.
“Qualquer coisa ‘inaceitável” aos outros ou a padrões de comportamento pode se tornar uma fonte de culpa e vergonha para o homem, e então ele vai se deitar no leito psicológico de Procrusto. O desmembramento psicológico decorre desse processo, pois os homens e as mulheres eliminam de si ou reprimem esses arquétipos ou partes de seu ser que fazem com que se sintam inadequados ou vergonhosos. Entendida metaforicamente, a admoestação bíblica que começa com “Se tua mão direita te ofende, corta-a fora” é um apelo à automutilação psicológica” – Jean Shinoda Bolem, em “Os Deuses e o Homem”.
Conhecer os deuses deve ocorrer em conjunto com o conhecimento do Patriarcado. Afinal, são forças invisíveis e poderosas que interagem e afetam cada ser. O Patriarcado amplia a influência de alguns arquétipos e diminui a de outros.
O Arquétipo do Pai
Zeus, Poseidon e Hades constituíram a primeira geração de deuses do Olimpo. Representam os três aspectos do arquétipo do pai. Dividiram o mundo entre si e cada um tomou posse de um reino em particular. Na qualidade de arquétipos e metáforas, o deus e seu domínio não precisam ser considerados juntos: Zeus e o céu, Poseidon e o mar; Hades e o mundo inferior.
Zeus regia tudo. Era o deus principal, e seus atributos pessoais são os que conferimos a pais e reis poderosos, aos homens alfa e às figuras de autoridade. Poseidon e Hades são aspectos da sombra de Zeus, aqueles elementos do arquétipo paterno que os homens de poder suprimem ou ignoram, assim como são dois padrões separados.
No Patriarcado, Zeus é o arquétipo dominante na cultura; portanto, é relevante para a psicologia, já que comanda a psique dos homens. Assim como o mundo na mitologia, a psique masculina se dividiu em: (1) O reino mental consciente do poder, da vontade e do pensamento (Zeus); (2) o reino das emoções e dos instintos (Poseidon), que é geralmente suprimido, desvalorizado e, às vezes, expulso do campo da nossa consciência; e, (3) o reino indistinto dos padrões invisíveis e dos arquétipos impessoais (Hades) , que só em sonhos costuma ser vislumbrado.
As condições nas quais esses três deuses principais nasceram existem como padrão na vida de muitos homens. Zeus, Poseidon e Hades tiveram pai distante e cuja animosidade se baseava no temor de que seus filhos terminariam por subjugá-lo; e mãe sem poder a aflita porque não conseguia nem protegê-los nem amamenta-los. Muitas pessoas vêm de famílias assim. Além disso, seja qual for a natureza específica de nossa família, todos vivemos em um patriarcado que valoriza mais a aquisição de poder e que favorece os homens que atingem essa meta. Esse padrão tem papel importante na psicologia masculina. – Os Deuses e o Homem – Jean Shinoda Bolen.
Zeus: Deus do Céu
Zeus foi o último filho de Cronos e Reia. Antes dele nasceram três irmãs e dois irmãos, todos engolidos por Cronos. Quando foi a vez de Zeus, Reia conseguiu salvá-lo colocando uma pedra embrulhada em vários panos no lugar do bebê. Com isso, impediu que seu filho fosse devorado. Em seguida, Zeus ficou escondido em uma caverna em Creta, e foi criado por uma ninfa.
Quando chegou à idade adulta, persuadiu a sábia Metis para que desse um emético a Cronos. Assim, ele vomitou os irmãos e uma pedra. Depois, com seus irmãos Hades e Poseidon e outros aliados, lutou contra Cronos e os Titãs, até então regentes do Olimpo e destronou-os. Foram dez anos de lutas para conquistar o Olimpo.
Após derrotar o pai, Zeus começou uma série de ligações com divindades femininas, ninfas e mulheres mortais, e assim, tornou-se o pai com qualidades divinas da maioria dos membros da segunda geração de olímpicos e semideuses.
O raio e a águia são os principais símbolos de Zeus. São expressões notavelmente hábeis da capacidade para decidir prontamente como agir e de decisões tomadas em um posicionamento distante. Esses traços caracterizam o arquétipo de Zeus.
“O domínio de Zeus era o céu e o arquétipo de Zeus predispõe o homem a viver enfiado em sua cabeça, expressando-se por meio de palavras e do poder para fazer com que as coisas aconteçam. Em uma cultura patriarcal esse homem leva uma vantagem considerável, pois espera-se que o homem superior seja “cabeça falante”, que trabalha bem com ideias e abstrações – como dinheiro e investimentos, lei e poder.” – Os Deuses e o Homem – Jean Shinoda Bolen.
O lado sombrio de Zeus pode aparecer em forma de paranoia, afinal, excesso de poder pode trazer obsessão. Então, temem ser destronados, desconfiam dos motivos e lealdades demonstradas e impedem que os outros cresçam. Essa atitude colabora para que surjam os inimigos que tanto temem. Como foi o caso de Urano, Cronos e o próprio Zeus. Esta é a parte sombria do arquétipo de pai.
Poseidon: Deus dos Mares
Poseidon vivia sob o mar, no reino que se tornou seu quando ele e seus irmãos Zeus e Hades tiraram a sorte para dividir o mundo. Para entender a emotividade que ele personifica e o domínio psicológico que rege, basta que lembremos as portentosas mudanças de condição do mar.
A esfera Poseidon é o reino das emoções e o homem em quem Poseidon é o arquétipo dominante está diretamente em contato com seus instintos e sentimentos, que expressa de maneira espontânea e imediata se for extrovertido e, se for introvertido, pode guardar em seu íntimo. Em ambos os casos, tem sentimentos profundos e intensos. E, por viver em uma cultura que prefere que os meninos e os homens não sejam emotivos, pode sofrer ao não ser compreendido quando expõe suas emoções para o mundo.
Deus dos mares, dos terremotos e dos maremotos, Poseidon tinha um temperamento instável e vingativo. Ele representa o inconsciente, amplo, misterioso e imprevisível. É o arquétipo das emoções, que se encontram profundas e ocultas e emergem, ainda que de forma irracional e instintiva.
Segundo Jean Shinoda Bolen, surgem problemas psicológicos quando a emotividade e as necessidades instintivas de Poseidon inundam a personalidade do homem e não são contidas nem intermediadas. Também ocorrem dificuldades quando as características são desvalorizadas, e, por conseguinte, “quem a pessoa é” não é aceitável. “Poseidon é a sombra de Zeus, o aspecto emocional do arquétipo do pai que é reprimido ou está enterrado e assim não se desenvolveu nem se acha acessível nos homens que se identificam conscientemente com Zeus”, explica a analista junguiana.
Hades: Deus do Mundo Inferior
Hades era filho de Cronos e Reia, que ao nascer fora engolido pelo pai. Quando Zeus e Métis obrigaram Cronos a regurgitar as crianças que havia engolido, os irmãos Hades e Poseidon uniram-se a Zeus para combater Cronos e os Titãs. Após a vitória, os irmãos tiraram a sorte para dividir o mundo em três partes e Hades ficou com o mundo inferior.
Hades era o deus invisível por ser o menos personificado e menos conhecido de todos. Para nos familiarizarmos com Hades precisamos descer para descobrir que existem riquezas a serem encontradas na penumbra, no frio e nas trevas que os místicos chamam de Noite Escura da Alma e os psicólogos descrevem como depressão profunda.
Percebemos, então, que o deus do mundo inferior e o mundo que ele rege têm o mesmo nome. O reino de Hades é o inconsciente, tanto na sua dimensão pessoal, como coletiva. É lá que residem as memórias, pensamentos e sentimentos que reprimimos, tudo que é doloroso ou vergonhoso demais. No mundo inferior do inconsciente coletivo existe tudo aquilo que podemos imaginar vir a ser e, também, tudo que já foi.
O reino de Hades, como ficou conhecido o mundo inferior, encontrava-se após cinco rios: Aqueronte, Cócito, Flegetonte, Lete e Estige. Depois deles, estava um portão de diamantes guardado por Cérbero, o cão de três cabeças.
Hades era também o deus da riqueza, pois era o guardião de toda a fonte dos minerais encontrados embaixo da terra, tais como o ouro, a prata e as pedras preciosas. Seu nome significa “aquele que não pode ser visto”, pois durante a guerra contra os titãs, recebeu dos ciclopes o elmo da escuridão, um capacete que permitia com que ele ficasse invisível quando o utilizava.